Não temas
Quando o Senhor chamou Jeremias, o Senhor lhe disse para não ter medo, pois estaria com ele o tempo todo, para protegê-lo. O Senhor estava fazendo dele uma cidade fortificada, uma coluna de ferro e um muro de bronze, contra toda a terra: contra Judá, seus oficiais, seus sacerdotes e o povo da terra. O Senhor estava lhe dando nada menos do que autoridade sobre nações e reinos, para arrancar e despedaçar, para arruinar e derrubar, para edificar e plantar.
Este Jeremias a quem Deus fez promessas tão grandiosas, muitos anos depois desabafaria com Deus, com queixas muito duras, a respeito do seu ministério. Algumas das palavras que ele usou foram: “Senhor, tu me enganaste e eu fui enganado […] A tua palavra trouxe-me insulto e censura o tempo todo. […] Maldito seja o dia em que eu nasci! […] Por que saí do ventre materno? Só para ver dificuldades e tristezas, e terminar meus dias na maior decepção?”
Para fazer justiça a Jeremias, devo esclarecer que ele disse essas palavras sobre forte emoção, porque tinha acabado de ser espancado e preso num tronco, a mando do sacerdote, por profetizar a palavra de Deus. Devemos convir que nós, no lugar dele, agiríamos igual ou talvez pior, afinal Deus tinha prometido protegê-lo e fazer dele uma cidade fortificada, uma coluna de ferro e um muro de bronze.
Pode parecer que Deus tenha falhado em cumprir a sua promessa, mas não é bem assim. Eu deliberadamente omiti a coisa mais importante e chocante que Deus disse a Jeremias, por ocasião do seu chamado. O Senhor lhe disse: “Não fique apavorado por causa deles, senão eu o apavorarei diante deles.”Em outras palavras: Não temas a eles, porque se você temê-los, eu mesmo atemorizarei você diante deles.
Preste atenção no peso dessas palavras. Se Jeremias ceder ao medo e recuar da sua missão, Deus mesmo será a fonte do seu terror. Se Jeremias não temesse, ele seria protegido, e sua confiança seria justificada, mas se temesse, ele não seria protegido, e o seu temor também seria justificado. Deus está dizendo:“Se você temer os homens mais do que a mim, eu farei com que o seu medo se torne realidade – e diante deles.”
Este texto me chamou a atenção porque o Senhor disse “não temas” em muitas ocasiões, mas esta é a única que nos apresenta a consequência do temor e do medo. Talvez o “não temas” mais célebre seja o dito a Josué, também por ocasião do seu chamado: “Não to mandei eu? Sê forte e corajoso; não temas, nem te espantes, porque o Senhor, teu Deus, é contigo por onde quer que andares.”
Note como o Senhor não advertiu Josué sobre as consequências do temor, como o fez a Jeremias, talvez porque Jeremias tivesse uma inclinação maior ao medo, ao contrário de Josué, que sempre manteve uma postura de coragem, mesmo quando o povo quis apedrejá-lo por causa da sua fé em Deus. Suas palavras sempre foram de ousadia, de confiança em Deus e de conquista.
Jeremias, por outro lado, em várias ocasiões pecou com seus lábios, queixando-se contra Deus. Veja, por exemplo, este outro exemplo de oração dele: “Por que é permanente a minha dor, e minha ferida é grave e incurável? Por que te tornaste para mim como um riacho seco, cujos mananciais falham?” Agora me diz se isso é coisa de se dizer para o Deus Todo-poderoso, o Deus que tinha se gabado de ser para Israel um manancial de águas vivas.
Não sem razão, o Senhor lhe respondeu: “Se você se arrepender eu o restaurarei para que possa me servir; se você disser palavras de valor, e não indignas, será o meu porta-voz. […] Eu farei de você um muro de bronze fortificado diante deste povo. Eles lutarão contra você, mas não o vencerão, pois estou com você para resgatá‑lo e salvá‑lo”, declara o Senhor.”Repare como esta fala é basicamente uma renovação da aliança que Deus fizera com Jeremias.
Uma aliança tem deveres de ambos os lados. Na aliança que Deus fizera com Jeremias, por ocasião do seu chamado, a responsabilidade de Deus seria usá-lo e protegê-lo, e a responsabilidade de Jeremias seria entregar a mensagem com ousadia e destemor. Foi Jeremias quem falhou em sua responsabilidade de confiar em Deus, mas em vez de reconhecer o seu pecado, ele se vitimizou e acusou o Senhor de ter quebrado sua aliança de proteção.
Uma coisa que eu aprendi com Jeremias é que as promessas de Deus existem para que confiemos nelas, e não para ficar jogando na cara de Deus, cada vez que pensamos que elas falharam. Se for para abrir a boca para vomitar palavras indignas, diante de Deus, fruto da nossa incredulidade, é melhor ficar de boca fechada. Se você parar de falar besteira, parar de queixar-se de Deus, e começar a dizer palavras de valor, então as promessas voltarão a ser uma realidade em sua vida. Em bom português, foi isso que Deus disse para Jeremias.
Jeremias tinha perguntado porque Deus estava sendo para ele um riacho seco, cujos mananciais falham, e Deus lhe respondeu que os mananciais voltariam a fluir, quando ele parasse de falar palavras indignas e começasse a falar palavras de valor, a respeito de Deus. Se as palavras indignas eram “por que minha ferida é incurável?” e ainda “por que Tu és um riacho seco?”, as palavras de valor seriam o contrário disso.
Aí nós lembramos do que Deus disse no começo: se você se intimidar por causa deles, então eu o intimidarei diante deles. Existe um princípio nessas palavras, que também podemos usar aqui, da seguinte forma: se você diz que sua ferida é incurável, então ela será incurável. Se você diz que eu sou um riacho seco, então eu serei um riacho seco para você.
Deus é extremamente exigente em matéria de fé. Ele não aceita nada menos do que a nossa confiança absoluta nele, o que implica em não termos medo de nada, nem de ninguém. Nós devemos olhar para nós mesmos, como o Senhor nos vê. Se o Senhor disse que nós somos uma cidade fortificada, uma coluna de ferro e um muro de bronze, então é assim que devemos nos ver. Somos inabaláveis e intransponíveis!