
Em uma viagem turística a Israel, em uma feira de artefatos históricos, Artur comprou, por ser barato, de um vendedor cheio de lábia, o que seria um artefato de pedra bem antigo, em forma de cuia. Ele a colocou de enfeite em sua estante, onde ficou por quase um ano, depois a transferiu para a pia do banheiro.
Um dia por pura curiosidade histórica lhe ocorreu encher a cuia de água, para lavar o rosto. Estava secando o rosto com a toalha, quando ouviu algo como um ruído atrás de si. Ele abaixou a toalha e quase enfartou com o que viu no espelho. Algo que só poderia ser descrito como a visão espiritual de um anjo alado, agitando a sua asa. Mais do que uma visão, era como se aquele ser fantástico estivesse realmente ali, tão real quanto ele mesmo. O anjo parecia tão surpreso por estar sendo visto, quanto ele por o estar vendo, de modo que ficaram ambos sem fala por alguns segundos.
“Não tenha medo”, disse o anjo por fim, com um tipo de voz profunda. “Existe uma explicação razoável para tudo, que passa por esse artefato ai...”, disse ele apontando para o objeto de pedra sobre a pia. “Eu o tenho seguido por anos, desde que foi descoberto em uma escavação, para que não caia nas mãos erradas. Esse objeto passou por muitas mãos, até chegar nas suas.”
“Eu não entendo…”, disse Artur, ainda em choque. Tinha um anjo bem ali, diante dele!
“Acho melhor você se sentar”, disse o anjo, conduzindo-o até a sala.
Ele se sentou no sofá.
“Devo estar sonhando! Como é possível?”
“É o que estou tentando lhe explicar. Esse objeto que você comprou. É graças a ele que você está me vendo. Ou melhor, é graças a uma oração feita há muito tempo. Você deve conhecer a história bíblica de Eliseu, sobre como ele orou pelo seu servo, para que ele pudesse ver o Reino Espiritual. O que o relato bíblico não conta é que Eliseu pegou da água que havia nesse lavatório de pedra e, com ela, lavou os olhos do seu servo, para que ele pudesse ver o exército de anjos. De alguma forma, a oração do profeta abençoou esse artefato, mesmo sem ele saber…”
O anjo interrompeu sua fala subitamente e as penas de suas asas se eriçaram. Um vento forte começou agitar as janelas e um outro ser alado apareceu na sacada do apartamento, muito semelhante ao anjo que acabara de conhecer, mas com uma diferença aterradora. Este tinha uma aparência chamuscada e acinzentada, como se tivesse saído do fogo do inferno.
“Então o velho artefato ainda funciona?”, disse ele com voz sádica. “Pensei que depois de tantos séculos, a unção tivesse acabado.”
“A esta altura, você já deveria ter aprendido a não subestimar a unção…”, disse o anjo, com seriedade, em uma posição que só poderia ser descrito como posição de batalha. “O artefato ainda funciona, mas, desta vez, você não irá utilizá-lo para seus fins sórdidos.”
“Não pense que irei desistir de algo tão valioso quanto a água de Eliseu…”
“Você não pode tocar nele…”
“De fato, eu não posso. Mas existem outros meios”, disse ele, antes de sair pela porta da sacada e alçar voo.
O pobre rapaz, que tinha assistido a tudo aquilo pasmo, se antes estava em choque, a esta altura estava aterrado.
“O que ele quis dizer com… outros meios?”
“Pessoas. Pessoas como você, mas que servem a ele.”
“O que isso significa?”
“Significa que você não está seguro aqui”, disse o anjo olhando pela janela, para a rua. “Eu deveria ter percebido”, disse ele. “Veja ali, do outro lado da rua, ao lado da banca de jornal.” Ele olhou e o que viu era diferente de tudo o que tinha visto até então. Escondido nas sombras, ele pode identificar um ser grotesco, como um animal deformado. “Aquilo é um demônio”, disse o anjo.
“Ele deve estar me seguindo há bastante tempo, esgueirando-se nas sombras… Precisamos sair daqui, agora. Pegue o que você conseguir, coloque em uma mala e vamos embora. E não se esqueça do artefato.” Ele fez a mala, enquanto o anjo vigiava pela janela.
“Podemos ir”, disse Artur.
“Precisamos descer pelas escadas”, disse o anjo, apontando pela janela para duas SUV’s escuras parando em frente ao prédio, das quais começaram a descer vários homens de terno. Eles saíram do apartamento apressadamente, começaram a descer as escadas e estavam passando pelo terceiro andar, quando foram surpreendidos pela criatura demoníaca que tinham visto do lado de fora. O anjo se lançou sobre a criatura e apertou seu pescoço, travando um embate com ela, até a criatura esvair-se no ar, como uma fumaça negra.
Saíram pela porta dos fundos do prédio, enquanto os homens de terno vasculhavam o apartamento. Pegaram o carro no estacionamento e saíram para a rua, mas foram vistos pelo motorista de uma das SUV’s, que passou a persegui-los pela avenida, até alcançá-los, batendo na parte de trás do veículo em que estavam.
“Faça alguma coisa!”, disse o rapaz.
“O que você espera que eu faça?”
“Não sei! Pule sobre eles, como sobre o demônio.”
“Eles são pessoas. Eu não posso fazer isso. Pelo menos não sem autorização.”
Boom! Mais uma pancada atrás. Ele perde a direção do carro, que se precipita da ponte para o rio, logo cobrindo-se de água. O anjo havia atravessado o teto do veículo e sobrevoava sobre a água em círculos.
“Meu Deus!”, gritou o rapaz, enquanto tentava se desvencilhar do cinto de segurança e chutava o para-brisas, inutilmente, com o carro afundando cada vez mais. O anjo, então, deu um mergulho na água e deu contra o para-brisas, estilhaçando-o. O rapaz saiu do carro, nadando em direção à superfície, quase sem fôlego. Depois, nadou em direção à costa, sob o olhar do homem de terno, que, de cima da ponte só podia observar. “Nós o perdemos”, disse o homem, pelo rádio.
Acomodaram-se em um pequeno hotel de beira de estrada, para passar a noite. “Quem são eles?”, perguntou o rapaz.
“Pertencem a uma organização muito antiga, que ocultam seus propósitos malignos, usando várias corporações como fachada. Estão sempre agindo nas sombras, para atender os interesses do líder deles, Satanás…”
“Aquele anjo que vimos?” “Não. Aquele é Iriel, um dos seus príncipes. Eles são os os verdadeiros líderes deste mundo; eles subjugam pessoas, fazendo delas suas escravas, mas você já sabe disso.”
“Sim. É o que diz a Bíblia.”
“Eles querem o seu artefato, para facilitar a comunicação com seus servos humanos. Sem isso, nós anjos podemos apenas sussurrar em seus ouvidos.”
“Por que simplesmente não quebramos o artefato e jogamos no mar?”
“Não seria uma boa ideia. Quem sabe se isso não transformaria todo o oceano em água de Eliseu? Não queremos que isso aconteça.”
“O que isso significa? Estou condenado a fugir para sempre?”, disse ele apreensivo.
“Tem um jeito de destituir esse artefato do seu poder, mas não será fácil. Precisamos colocá-lo nas mãos de Iriel, ou de outro caído como ele.”
“Mas isso é tudo o que eles querem!”
“Eles querem o artefato, sem dúvida, mas não querem por as mãos sobre ele. Eles sabem que suas malditas mãos o maculariam, tornando-o sem efeito.”
“Se eles sabem disso, jamais colocarão a mão.”
“Precisamos de um plano, um plano muito bem elaborado… Mas vamos deixar para amanhã. Você já passou por coisas demais para um dia. Mas antes, ouça. Amanhã quando acordar, torne a lavar o rosto no artefato. O efeito da água de Eliseu se vai durante o sono… Sonhe com os anjos.”
CONTINUA…
Gostaria de recomendar meu livro, um romance emocionante e divertido com pano de fundo cristão, que aborda questões como relacionamento pais e filhos, primeiro amor e segundas chances.