O mensageiro maltrapilho [editado]

April 26, 2018

— Tenho boas notícias — disse o homem, ofegante como se tivesse atravessado o mundo para chegar a mim.

Tinha a barba por fazer e as roupas rasgadas como um mendigo, e eu notei que sua camisa estava suja de sangue.

— Você está ferido? — eu lhe perguntei, preocupado.

— Um pouco — ele disse.

Percebi que ele mal conseguia parar em pé.

— Quer que eu o leve para o hospital?

— Não é necessário — ele respondeu. — Vou me recuperar.

Não deveria ter acreditado nele, mas eu só perceberia isto mais tarde.

— Você parece com fome — eu lhe disse. — Quer comer alguma coisa?

— Eu aceito. Passei fome durante a viagem.

— Vamos. Eu lhe pago um lanche.

Enquanto caminhávamos até o carrinho de cachorros-quentes, eu lhe peguntei:

— Como você se feriu?

— Eles me prenderam e bateram em mim. Eu quase morri.

— E por que fizeram isto com você?

— Eles queriam me calar. Não queriam que eu chegasse até você. Mas não conseguiram me deter.

Chegamos ao carrinho.

— Um cachorro quente, por favor — pedi.

— De que tipo? — perguntou o lancheiro.

— Um bem grande — respondeu e o homem maltrapilho.

Enquanto o lancheiro preparava o lanche, continuamos conversando.

— Tem certeza que está bem? Você não me parece bem.

— Como eu estou não é importante. O que é importante é a mensagem que eu trouxe para você. Foi para isto que eu vim de tão longe.

— Você me conhece?

— Não.

— Então como sabe que a mensagem é para mim?

— Eu apenas sei — ele disse. Então teve uma crise de tosse.

— Você não está nada bem — eu lhe disse, apoiando as mãos em seus ombros. — As suas roupas estão molhadas!

— É por causa do naufrágio.

— Naufrágio? Que naufrágio?

— O barco que me trazia para cá naufragou e ficamos à deriva o dia inteiro, antes de sermos resgatados.

O lanche ficou pronto. Eu lhe entreguei o cachorro-quente e ele começou a comer.

— Eu não consigo — ele disse.

— Você está muito debilitado. Precisa comer.

— A mensagem é mais importante.

— A mensagem pode esperar.

— Não, você não entende. A mensagem não pode esperar.

— Chega dessa história — eu lhe disse. — Você mal consegue parar em pé.

— Você não entende… — ele disse. Então teve mais uma crise de tosse.

Ele se apoiou em mim e então desfaleceu em meus braços.

— Chame por ajuda! — disse eu ao lancheiro. Ele ligou para a emergência e pouco depois apareceu uma ambulância para levá-lo.


Fui para o hospital no meu carro, para ter mais informações sobre o estado de saúde daquele homem de quem eu nem sabia o nome. Fui recebido por uma enfermeira.

— Ele não resistiu — disse ela.

— Ele… ele morreu? — perguntei, pasmo, tentando assimilar a notícia.

— Ele perdeu muito sangue. Estava desnutrido.

— O que aconteceu com ele?

— Não sabemos. Pensei que você poderia nos explicar.

— Eu não o conhecia. Ele me abordou com uma história mirabolante. Disse que tinha vindo de longe, disse que estava há dias sem comer…

— Isso explica a desnutrição — disse ela.

— Disse que o tinham capturado, maltratado e espancado.

— Algo do tipo deve ter acontecido, porque as suas costas estão cheias de feridas, como se tivesse sido severamente açoitado.

— E o mais absurdo! Ele também me disse algo sobre ter sobrevivido a um naufrágio, enquanto viajava para cá. Eu não acreditei nele, mas as suas roupas estavam molhadas…

— Isso explica as algas — disse a enfermeira.

— As algas?

— Sim. Encontramos algas marinhas no seu bolso.

— Não acredito! — disse eu perplexo. — Você acha possível que ele realmente tenha estado no mar?

— Você tem outra explicação para as algas?

— Não.

— Eu também não.

— Pensei que ele fosse um mendigo com esquizofrenia.

— Eu atendo mendigos todos os dias. Ele não parecia um mendigo pra mim.

— … mas a história dele não faz sentido. Ele disse que passou fome, que foi maltratado e sobreviveu a um naufrágio apenas para me dar uma notícia, uma boa notícia.

— Talvez fosse verdade.

— Não faz sentido. Quem passa por tudo isso apenas para dar uma notícia? — eu lhe perguntei.

— Alguém que se importa? — respondeu ela.

— Você pode ter razão — eu lhe disse. — Havia algo de verdadeiro na forma como ele me olhava.

— Você deveria ter lhe dado ouvidos.

— Como eu poderia? O que ele falava parecia loucura.

— Não se julga um livro pela capa. É o que meu pai dizia.

— Se eu pudesse voltar atrás, eu teria lhe dado ouvidos — disse eu mais para mim mesmo, do que para a enfermeira.

— Eu adoraria continuar conversando, mas preciso voltar ao trabalho.

— Me desculpe, estou aqui falando com você como se fosse uma psicóloga. É que fiquei um pouco abalado com a notícia.

— Não tem problema — disse ela. E foi embora.

Eu me virei para ir embora também e comecei a andar pelo corredor. Pouco depois a enfermeira me alcançou.

— Quer ficar com isto — disse ela. — São as roupas dele.

— Fico — respondi.

A enfermeira foi para um lado e eu fui para o outro. Enquanto caminhava, um dos pertences do homem caiu no chão. Um pequeno livro surrado e de capas negras.

Passei os dias seguintes devorando cada página do livro, como quem descobre um tesouro perdido.

O que eu posso dizer sobre o que estava escrito? Era o tipo de notícia pela qual eu mesmo estava disposto a atravessar rios e correr risco de morte para que outros a ouvissem.


Este texto, pensado para ser uma pequena peça de teatro, é uma homenagem a todos os mártires que deram a sua vida e carregaram a sua cruz para que o evangelho pudesse chegar até nós. Também é um apelo a que também façamos o mesmo, para que o evangelho alcance outras pessoas, porque as pessoas não nos darão ouvidos a menos que vejam o quanto nos importamos com elas.


Gostaria de recomendar meu livro, um romance emocionante e divertido com pano de fundo cristão, que aborda questões como relacionamento pais e filhos, primeiro amor e segundas chances.