A quem se destina a grande Comissão?
Os onze discípulos foram para a Galiléia, para o monte que Jesus lhes indicara. Quando o viram, o adoraram; mas alguns duvidaram. Então, Jesus aproximou-se deles e disse: “Foi-me dada toda a autoridade nos céus e na terra. Portanto, vão e façam discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a obedecer a tudo o que eu lhes ordenei. E eu estarei sempre com vocês, até o fim dos tempos” (Mt 28.16–20).
Se eu perguntasse a quem deu Jesus esta ordem de fazer discípulos, creio que a maioria aqui responderia que a grande Comissão é uma ordem dada a cada um de nós individualmente. Eu mesmo tive a oportunidade de ensinar desta forma em muitas ocasiões, mas hoje eu vejo que esta questão não é, assim, tão simples de ser respondida.
Veja, por exemplo, a questão do batismo. Se a grande comissão é um chamado individual, para todos os discípulos, isto significa que todos devemos batizar? Se está na grande Comissão a resposta é sim, alguém poderia dizer. Bem, neste caso o apóstolo Paulo estaria contrariando o ensino de Jesus, quando disse que Cristo não o havia enviado para batizar, mas para pregar o evangelho (1 Co 1.17). Alguém aqui se atreveria a confrontar o apóstolo Paulo nesta questão?
Vamos avançar um pouco mais. O chamado de Jesus engloba, também, um “ir às nações”. Se este for um chamado individual, para todos os discípulos, então todos nós deveríamos ir às nações. Como o termo “nações” está no plural, então deveríamos ir, pelo menos, a mais de uma nação, para cumprir a grande Comissão. Mas embora a maioria de nós acredite que a grande Comissão seja individual, no que se refere a pregar e ensinar, ninguém se atreve a dizer que todos deveríamos ir literalmente às nações, ou que todos deveríamos batizar. Isto não tem lógica. Ou toda a grande Comissão é individual, ou nada é.
Bem. Supondo então que a grande Comissão não seja um chamado individual, a quem esta ordenança está destinada de fato?
Há quem afirme que a grande Comissão é dirigida aos apóstolos, e existe um argumento muito forte nesse sentido. Se você analisar o texto, perceberá que os onze discípulos estavam naquele monte por indicação de Jesus, o que indica uma espécie de convocação para uma reunião. Se Jesus tinha muitos outros discípulos, além dos onze, porque é que ele convocou apenas os onze, nesta ocasião? Devido à importância da grande Comissão, não fazia mais sentido reunir-se com todos os discípulos? O apóstolo Paulo escreveu aos Coríntios que, certa vez, Jesus apareceu a mais de quinhentos discípulos de uma só vez (1 Co 15.6). Esta não seria a melhor oportunidade para ordenar a grande Comissão? Todavia ele chamou apenas onze.
Estes onze eram exatamente aqueles discípulos que o mestre havia escolhido, entre todos os outros discípulos, para designá-los apóstolos (Lc 6.13). O termo “apóstolo” significa “enviado com uma missão”. O termo era usado originariamente para o envio de uma frota, ou um exército, para a guerra. Com o tempo, o termo passou a ser usado para designar um grupo de homens enviados com uma missão. Ou seja, antes de morrer Jesus escolhera doze discípulos para enviá-los em uma missão. Agora tinha chegado a hora de dizer-lhes qual era essa missão. Ele chamou apenas os onze e lhes deu como missão ir fazer discípulos em todas as nações, e, de fato, eles foram.
Esta parece ser uma ótima explicação, com relação aos destinatários da grande Comissão, mas também tem alguns pontos de difícil solução. Esta é a principal delas: Se a responsabilidade pela grande Comissão era de fato apenas dos Apóstolos, então eles fracassaram em sua missão. O ir às nações englobava, também, o pregar a toda criatura, o que eles certamente não conseguiram fazer. Eles viajaram por tudo o mundo conhecido, naquela época, pregando a palavra de Deus, mas quem se atreve a dizer que eles pregaram a todas as pessoas que existiam naquele tempo?
Outro ponto complicado é o seguinte: Jesus lhes tinha dito que estaria sempre com eles, até o fim dos tempos, todavia Jesus não pôde cumprir sua promessa estar com os apóstolos até o fim dos tempos, porque os apóstolos já morreram, mas o fim dos tempos ainda não chegou. Neste ponto, alguém poderia alegar que Jesus está com eles no céu, logo a palavra está cumprida, mas a verdade é que essa não é a interpretação mais apropriada, neste caso. A promessa de Jesus é que estaria com eles, no desempenho da grande Comissão. Este é o sentido do texto.
O que vimos até agora, mostra que é difícil, senão impossível, atribuir a grande Comissão a cada um de nós individualmente, do mesmo modo que é difícil atribuí-la apenas aos apóstolos. Então a quem é que a grande Comissão é direcionada, afinal?
A grande comissão só pode ser entendida, plenamente, quando interpretada como uma ordem direta à igreja.
Se é desta forma, porque então Jesus chamou apenas os onze apóstolos para ordená-la? Ele chamou os onze, porque eles eram o fundamento sobre o qual a igreja seria edificada (Ef 2.19). No contexto da igreja, a eles o Senhor Jesus estava colocando em primeiro lugar (1 Co 12.28), como líderes e representantes. Eles estavam ali como representantes de todo o corpo de Cristo, recebendo de Cristo, que é o cabeça da igreja, a sua grande Comissão.
O mais importante do que estamos dizendo, é que esta grande Comissão nos alcança como igreja, e não individualmente. É a igreja que deve ir às nações. É a igreja que deve fazer discípulos. É a igreja que deve batizar. É a igreja que deve ensinar. Neste ponto, alguém poderá argumentar. Se é missão da igreja, então é a minha missão, porque eu sou a igreja. Na verdade, você não é a igreja, você faz parte dela. E o fato de algo ser a missão da igreja, não significa que seja a sua missão.
É neste ponto que a grande Comissão dada por Jesus se harmoniza com os ensinos do apóstolo Paulo. A igreja é um corpo com muitos membros e esses membros não exercem todos a mesma função. Temos diferentes dons, de acordo com a graça que nos foi dada, mas nem todos temos o mesmo dom. Alguns tem o dom de profetizar, outros o dom de servir, outros o dom de ensinar, outros o dom de motivar, outros o de contribuir, outros o de liderar e outros o de misericórdia.
Cada pessoa tem o seu dom, tem o seu chamado, e é com esse dom que ela deve contribuir para o Reino de Deus. Nem todos foram chamados para ir às nações, nem todos foram chamados para batizar e nem todos foram chamados para ensinar. Se tem o dom de ensinar, que ensine. Se tem o dom de servir, que sirva. Se tem o dom de contribuir, que contribua. Se tem o dom de liderar que lidere. O que não pode é a mão tentar ser pé e a boca tentar ser ouvido. Ou seja, cada um deve exercer o ministério para o qual foi chamado. “São todos apóstolos?” Pergunta o Apóstolo. “São todos profetas? São todos mestres? Têm todos o dom de realizar milagres? Têm todos o dons de curar? Falam todos em línguas? Todos interpretam?” É óbvio que não.
Isto significa que, com relação ao cumprimento da grande Comissão, somos avaliados como igreja e não individualmente. Se a igreja está conseguindo discipular, então cada membro da igreja está cumprindo a grande Comissão, mesmo que não esteja batizando ou ensinando. O irmãozinho que lava o banheiro da templo, para receber bem os convidados, tem tanta responsabilidade pela alma que se converte que o pregador que fez o apelo. Quem sustenta o missionário que vai para outro país está cumprindo a grande Comissão tanto quanto ele.
O apóstolo Paulo ensina que a maturidade espiritual se alcança pelo trabalho conjunto dos apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres, cada qual fazendo a sua parte com o fim de preparar os santos para a obra do ministério, até que todos alcancemos a unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, e cheguemos à maturidade, atingindo a medida da plenitude de Cristo.
O propósito é que não sejamos mais como crianças, levados de um lado para outro pelas ondas, nem jogados para cá e para lá por todo vento de doutrina e pela astúcia e esperteza de homens que induzem ao erro. Antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo. Dele todo o corpo, ajustado e unido pelo auxílio de todas as juntas, cresce e edifica-se a si mesmo em amor, na medida em que cada parte realiza a sua função.
O alvo do discipulado é a maturidade, e a maturidade é alcançada, não pela ação de um individualmente, mas pela contribuição de todo o corpo, quando cada parte realiza a sua função.
Jesus discipulava individualmente, você pode dizer, e você tem razão neste ponto, mas isto não significa que nós também devemos discipular individualmente. Em seu ministério terreno, Jesus realizava a grande Comissão individualmente, porque ele tinha a capacidade espiritual necessária para fazê-lo. Todos os dons do Espírito estavam reunidos em uma única pessoa. Todavia, quando Jesus subiu aos céus, ele distribuiu estes dons entre os membros da igreja, de modo que nenhum de nós é como Jesus individualmente, mas todos juntos formamos o corpo de Cristo.
A conclusão do que foi exposto é que não podemos ensinar que a grande Comissão de Jesus é para todos, individualmente, porque nem todos foram chamados para evangelizar, discipular, batizar ou ensinar. A verdade é que se fôssemos uma igreja de apenas quatro discípulos, poderíamos estar cumprindo a grande Comissão de duas formas: 1) com cada membro realizando todas as quatro funções, individualmente; ou 2) com a distribuição destas quatro funções entre os quatro membros, de acordo com o chamado de cada um.
Penso ter demonstrado que esta segunda forma é a mais correta, de acordo com o ensino da palavra de Deus.
Gostaria de recomendar meu livro, um romance emocionante e divertido com pano de fundo cristão, que aborda questões como relacionamento pais e filhos, primeiro amor e segundas chances.